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MPT analisa como fiscalizar riscos trabalhistas do home office

Ministério Público do Trabalho observa que cenário exige adaptação das fiscalizações realizadas. Sindicatos e MPT têm recebido inúmeras denúncias de abusos cometidos pelas empresas.

O home office oferece riscos de doenças e acidentes, segundo o procurador-geral do trabalho, Alberto Bastos Balazeiro, o que exige uma adaptação das fiscalizações realizadas pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), já que não é possível entrar na casa dos trabalhadores. Isso não significa, contudo, que as fiscalizações realizadas pelo órgão estejam suspensas, nem que as Medidas Provisórias que mudam relações de emprego nessa época passem despercebidas, pois a punição a eventuais abusos não pode esperar a pandemia passar.

Balazeiro, que assumiu o comando do Ministério Público do Trabalho (MPT) em agosto do ano passado, falou ao jornal Valor Econômico das expectativas e desafios das relações do trabalho no período pós-pandemia. “O primeiro desafio do home office é o direito à desconexão, ter uma separação clara entre residência e local de trabalho”, disse.

No home office, para evitar o adoecimento, o primeiro desafio é a questão psicológica, o direito à desconexão, que consiste em ter uma separação clara entre residência e local de trabalho, segundo o procurador. Além disso, é necessário ter mais cuidado com a jornada já que, em casa, é mais fácil ultrapassar as horas de trabalho.

Há ainda a questão das condições ergonômicas, que tendem a ser mais precárias em casa do que nas empresas, já que há mais improviso com o local das telas de computador e o uso do teclado. A fiscalização encontra dificuldades até pela inviabilidade de entrar nos domicílios, mas Balazeiro afirma que, assim como meios de tecnologia são úteis no trabalho, o MPT também pode se valer de recursos virtuais.

Apesar do home office ter sido implantado em muitas empresas, existem fiscalizações sendo realizadas mesmo durante a pandemia. Na última semana foram feitas ações de combate ao trabalho escravo. Segundo Balazeiro, têm sido utilizados os meios diretos de fiscalização, reconhecendo a excepcionalidade do momento, sem deixar de fiscalizar o que é preciso e usando meios documentais.

Há uma fiscalização específica sobre a Medida Provisória 936, que autoriza a suspensão de contrato de trabalho e redução de jornada e salários. O começo da fiscalização foi sobre como evitar filas e dar mais acesso aos trabalhadores atingidos pela pandemia ao benefício previsto para quem tiver a redução salarial. Além disso, o MPT recebeu denúncias sobre empresas que estão recebendo o benefício sem ter a redução de jornada e salário.

Outro ponto de atenção é como está sendo feita a suspensão dos contratos e a negociação para redução de jornada. O MPT tem estimulado que sejam feitas convenções ou acordos coletivos relacionados ao tema para evitar fraude, vício de formação na convicção de quem fez a redução.

Existe também um grupo de trabalho no MPT identificando as ações em que empresas usam o artigo 486 da CLT para não pagar a rescisão completa ao trabalhador – alegando que parte deve ser paga pelo governo, que impediu a realização da atividade pela companhia. Há investigações do MPT em curso sobre o tema. E os procuradores têm liberdade para se manifestarem da forma como entendem nos processos – eles não são submetidos a um argumento central do MPT.

O procurador acredita que mudanças ocorrerão e que o teletrabalho, até então uma exceção, será uma tendência. Os desafios em relação ao tema serão muitos, principalmente a busca pelo equilíbrio entre a jornada de trabalho e o tempo de descanso e a saúde mental do trabalhador — em um ambiente que será de grande competição por emprego.


Deveres da empresa

O artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi alterado em 2011 pelo Congresso e estabeleceu que, ficando na empresa ou em casa, o trabalhador tem os mesmos direitos. A exceção é o vale-transporte que, evidentemente, sem a locomoção até o escritório, não precisa ser pago. Se o colaborador for chamado extraordinariamente para um compromisso na sede, como uma reunião, por exemplo, aí receberá o benefício proporcionalmente.

Com o avanço do novo coronavírus no Brasil, as empresas, preocupadas com a saúde de seus empregados, podem adotar modelos alternativos de trabalho para dar continuidade às atividades do dia a dia, tendo em vista a consideração de se evitar aglomerações de pessoas. Nessa situação, destaca-se a possibilidade de utilizar o home office (chamado de “teletrabalho” na legislação).

Como forma de proteger o empregado e seus colegas de trabalho, as empresas devem propor, ainda que de forma provisória, a opção pelo trabalho remoto. O consentimento deve ser registrado em um aditamento ao contrato de trabalho.

A legislação prevê que ambas as partes devem negociar a responsabilidade pelo fornecimento dos equipamentos para a realização do home office. Caso os dispositivos sejam concedidos pela empresa, em hipótese alguma podem ser considerados como parte da remuneração do funcionário.

Cabe à empresa, nessa situação, arcar com o aumento das despesas do empregado em relação às contas de energia elétrica, telefonia, internet, etc. Como nesse período não haverá deslocamento do funcionário, o vale-transporte pode ser suspenso. O vale-refeição e o vale-alimentação, contudo, devem ser mantidos.

Embora o empregado trabalhe em sua própria residência, a legislação determina que a empresa tem responsabilidade pelas condições de trabalho, de modo que deve providenciar orientações sobre medidas de segurança com o objetivo de evitar doenças ocupacionais ou acidentes.

O empregado, por sua vez, deve se comprometer a estabelecer e cumprir uma rotina ou horário de trabalho, permanecendo on-line para interagir com a equipe e cumprir os prazos das tarefas. Além disso, deve atender às convocações para comparecimento à empresa, consultar regularmente os canais de comunicação estabelecidos (e-mail, WhatsApp, etc.) e preservar o sigilo dos dados acessados de forma remota.

Em função do trabalho a distância, vale a pena considerar a opção de liberar o funcionário do controle de horário, estipulando que, nesse período, o serviço seja remunerado por tarefa ou produção. É importante que isso também conste no aditamento ao contrato de trabalho.

O contato por meio da videoconferência é importante para a saúde mental, que também é uma preocupação das empresas, segundo a advogada. “A experiência [de quarentena] é horrível. Mas espero que consigamos colher algo positivo quando acabar, como a habilidade de trabalhar remotamente.”

Outra questão que tem sido levantada, de acordo com Carolina Marchi, sócia do Machado Meyer Advogados, é sobre a necessidade de mudança do contrato de trabalho. Ela lembra que Medida Provisória nº 927, do dia 22, tornou facultativa a medida. Mas o texto, acrescenta, não estabelece de forma clara se o empregado deve ser ressarcido por gastos com internet e luz e se vale-refeição e transporte devem ser pagos.

“Pela leitura da CLT, em tese, é ‘in dubio pro operário’ e a empresa teria que fornecer tudo”, afirma Maurício Tanabe. Na situação atual, diz, os empregadores precisariam oferecer o equipamento básico para o trabalho, como computador, mas ficam em dúvida sobre os gastos, uma vez que, como a quarentena acontece em casa e inclui toda a família, é difícil quantificar qual parcela das contas seria equivalente ao trabalho, Na dúvida, um de seus clientes resolveu se antecipar e pagar R$ 35 por mês como ajuda de custo.

 

Com informações do Valor e do Sindicato dos Bancários e Financiários de SP, Osasco e Região.